Lá vai a pergunta: Baseado na novela Caminho das Índias, como ficaria no mundo real a situação de Silvia Cadore? O marido morre, "ressuscita" e ela já está casada legalmente com outro. Ela pode ser dada como bígama? E como se desfaz essa "encrenca"?
Tive que pedir ajuda ao meu irmão.
Resumo: Silvia Cadore era uma cujo marido forjou a própria morte. A doida, com fogo na periquita, nem esperou muito e se jogou na pista pra game, casando novamente. No meio da coisa toda, volta o marido dos mortos, para surpresa geral da nação.
E agora, Mister M?
Eu já mencionei que o mundo já foi uma grande suruba. Para os homens, é claro. Eles podiam ter quantas quisessem. Não vou repetir. Se quiser saber mais sobre essa história, clique aqui.
No Brasil, a bigamia é crime. Na verdade, sempre foi, desde o século XVII. No início era punida com a morte. Só que depois devem ter visto que o povo era bom na milenar arte da sacanagem e acabaram por observar que, se a pena fosse mantida, logo não sobraria ninguém. A coisa deu uma abrandada e hoje a bigamia está no Código Penal, no Art. 235, que está logo a seguir:
Art. 235 - Contrair alguém, sendo casado, novo casamento:
Pena - reclusão, de dois a seis anos.§ 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou detenção, de um a três anos.
§ 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime.
Perceba, que pela leitura do artigo, o crime seria consumado. Sílvia Cadore é alguém (fictício, mas é alguém), era casada, e contraiu novo casamento.
Pausa para explicação: no Brasil, definimos o crime como algo típico, antijurídico (eu prefiro ilícito) e culpável.
Passsando para o português simples (lembrando que a intenção aqui não é dar aula de direito):
- Típico: O fato precisa estar elencado na lei como crime. Não adianta eu amanhã inventar que comete crime todo aquele que anda de camisa vermelha. Nenhum juiz pode fazer isso. Nem um ministro de qualquer tribunal superior. O fato precisa estar exposto em lei como crime.
- Ilícito: O fato precisa ser proibido por lei, ou seja ilícito. A uma primeira vista, parece ser óbvio, mas nem tanto. Matar é proibido, pelo Art. 121 do Código Penal (homicídio). Mas é plenamente permitido a um policial de serviço matar um assaltante que esteja ameaçando uma velhinha. Neste caso, a conduta é típica (está no Código Penal no Art. 121), mas não é ilícita, pois é permitido a um policial matar alguém no cumprimento do dever.
- Culpável: Essa é um pouco mais difícil de definir, mas, falando de um modo simples, é a capacidade de culpar alguém. Para culpar alguém, é necessário que aquele que comete o crime tivesse podido agir conforme a lei e, para isso, a pessoa deve ter capacidade de entender o que faz. Além disso, é preciso que o fato tenha ocorrido em circunstâncias normais, de modo que a pessoa podia e devia fazer o que é certo. Um exemplo é alguém que tem 25 anos, mas possui uma idade mental de 6 anos. Se esta pessoa matar alguém, cometerá um fato típico (está no Código Penal no Art. 121), ilícito (os débeis mentais não tem permissão da lei para matar ninguém, então o fato é proibido), mas não é culpável (pois o débil mental, por sua condição, não pode entender que o que faz é reprovável).
Então, percebemos que podemos afastar a ilicitude de um fato ou a culpabilidade ou o tipo. Essas formas de afastar o tipo, a ilicitude e a culpabilidade chamam-se excludentes.
Pois bem, pra que a masturbação jurídica?
Vamos analisar a conduta de Sílvia Cadore:
Nossa amiga cometeu um fato típico (a bigamia está no Código Penal, no Art. 235), culpável (ela sabia muito bem o que estava fazendo e ela podia não ter casado), mas neste caso, a conduta não é considerada ilícita por algo chamado erro de tipo. Veja o que está no Art. 20, § 1º do Código Penal:
Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
§ 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.
Não foi o que aconteceu? Sílvia Cadore achou que o marido tinha morrido, e a morte acaba com o casamento (Art. 1571, inciso I do Código Civil). Então achou que estava livre e desimpedida e casou. Como não existe bigamia culposa, não terá pena alguma.
O mais legal é o que acontece com o chifronésio marido dela. Leia o § 3º do Art. 20 do Código Penal:
§ 2º - Responde pelo crime o terceiro que determina o erro.
Então, desta forma, o bonito, além de outras coisas mais (não é objeto do post e também não quero alongar muito), ainda vai ter que responder pela bigamia da esposa.
O post hoje foi cheio de conceitos jurídicos... Achei meio pesado. E você? O que achou? Deixe seu recado nos comentários. Se quiser, ouça uma musiquinha para relaxar e passe no meu blog novo, o http://discoscomentados.blogspot.com/. Não deixe de passar na minha vakinha: http://vakinha.uol.com.br/Vaquinha.aspx?e=5987.
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3 comentários:
Eu adoreeeei o fato de que se a situação fosse real o safado do Raul Cadore ainda ia ser enrabado pela bigamia da mulher. kkkkkkkk
Bem-fe-i-to!
Eu achei muito interessante e muito construtivo seu blog.
Irá ajudar muito as pessoas e a mim tbm.
Agora quanto ao seu Laptop, eu até poderia te dar o meu, mas to vendendo ele.
Quer comprar quando estiver com sua vaKinha totalmente feliz? rsrsrsrs
Um grande abraço e parabéns.
Você não assiste novela, mas em compensação para o youtube você dá audiência.
o que é aquela senhora de 60 anos??? Foi surreal a simplicidade como ela se desnuda, principalmente o que ela diz ao final. Pelo menos ela é feliz né? Coisa boa, cada um por si...ahahah.
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